27 de out. de 2021

CAPACITAÇÃO EM TÉCNICAS PARA MAIOR EFICIÊNCIA EM RESTAURAÇÃO FLORESTAL

Data: 29/09/2021 das 8 as 15 horas.

Por: Ceceo Chaves - Engenheiro Agrônomo da URBAM, membro fundador da Rede Agroflorestal do Vale do Paraíba, responsável por articular os agricultores para implantação de SAF experimentais na APTA - Polo Regional do Vale do Paraíba entre os anos de 2014-2016.

Objetivo: capacitar os funcionários da URBAM, empresa pública de São José dos Campos, que atuam em atividades de recomposição florestal.  

Metodologia/ Conteúdo programático:  Visita aos módulos de restauração florestal e banco de sementes de adubação verde da APTA. Técnicas de plantio e manejo de espécies utilizadas para adubação verde, cercas vivas e cordões vegetados em sistemas de restauração florestal. Manejo da matéria orgânica nos sistemas. Métodos de restauração com sementes X restauração com mudas.

Local: Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio, Polo Regional Vale do Paraíba – Avenida Dr. Antônio Pinheiro Junior, 4009 - Pindamonhangaba SP.

Professores/facilitadores: Antonio Carlos Pries Devide e Cristina Maria de Castro, pesquisadores  da APTA.

 

Introdução

Participaram desta capacitação 18 funcionários da URBAM , sendo que 17 não tinham praticamente nenhuma experiência com agroecologia, adubação verde e os temas abordados.  Todos trabalharam até o momento apenas com arborização urbana, paisagismo , viveiros e sistemas de restauração florestal simplificados que utilizam apenas plantios das mudas nativas exigidas nas compensações determinadas pela CETESB. Esses sistemas simplificados geralmente são pouco eficientes, com alta mortalidade de mudas, desenvolvimento lento e altos custos de manutenção , principalmente com a roçada das gramíneas espontâneas e reposição de mudas. Ao encerrar o processo de compensação (geralmente 36 meses após a conclusão do plantio), a diversidade de espécies arbóreas é muitas vezes baixa, predominando espécies pioneiras de crescimento mais rápido que geralmente são as espécies menos ameaçadas e de menor importância ecológica.

Objetivos:

Essa capacitação visou mudar a realidade dos trabalhos de restauração florestal realizados pela URBAM, empoderando os funcionários na compreensão da dinâmica dos sistemas, tornando-os ativos nos processos de decisão e não apenas meros executores das ordens dos responsáveis técnicos. Com emprego de plantas de serviço (adubação verde) e manejo da matéria orgânica espera-se aumentar a eficiência da mão de obra empregada, reduzindo a necessidade de roçadas e reposição de mudas e um desenvolvimento mais rápido das mudas nativas com resultado final mais biodiverso e ecologicamente relevante.

Desenvolvimento das atividades:

Conhecendo um módulo de SAF:

O dia iniciou com visita ao módulo SAF mais recente da APTA, (macaúba, frutas nativas, banana, mandioca , gliricídia e outras plantas de serviço) onde o pesquisador da APTA Antonio Devide apresentou uma breve introdução aos sistemas agroflorestais e de restauração florestal produtiva com emprego de plantas de serviço (adubações verdes) e as diversas vantagens em relação aos sistemas de restauração simplificados sem o emprego de outras plantas além das árboreas nativas (Figura 1).


 Figura 1. Diálogo no SAF macaúba sobre recobrimento do solo, manejo de Gliricidia sepium em consórcio com bananeira e frutas nativas da família Myrtacea.

Atividade prática:

Após conhecer um modelo de sistema já implantado como exemplo, o grupo realizou a prática de plantio escalonado de um pequeno módulo de  500 m2 com plantio de Eritrina (árvore nativa da mata atlântica, pioneira de rápido crescimento) feijão de porco e mamona como adubação verde, banana BRS Princesa, tipo maçã, cultivar da Embrapa tolerante ao mal do panamá e quiabo. Estas espécies plantadas inicialmente são pioneiras,  de rápido crescimento para recobrimento da área. Posteriormente numa 2° etapa de plantio serão plantadas espécies secundárias de crescimento mais lento e que se desenvolvem melhor nos ambientes parcialmente sombreados e mais protegidos proporcionados pelas plantas de recobrimento.

 

Figura 1. Orientação para realização da prática de plantio.

Figura 2. Atividade prática de plantio.

Conhecendo outros sistemas de restauração produtivos:

Após a prática de plantio foi realizada visita a outros módulos de restauração mais antigos, instalados na APTA. No “SAF Olho D’água” cuja implantação iniciou em janeiro de 2012 e encerrou em 2013 os visitantes puderam conhecer as diferenças entre os plantios realizados a partir de sementes e os realizados com mudas. Nessa área de 2000 m² foi realizado plantio no espaçamento comercial em área total de banana BRS Conquista, cultivar tolerante às principais doenças que atacam a cultura da banana juntamente com diversas árvores nativas como o guapuruvú e a palmeira jerivá e as frutíferas grumixama, araçá, cabeludinha, entre outras.

Em seguida o grupo conheceu uma área de pouco mais de 1 hectare , vizinha ao SAF olho d’água onde foi realizado um plantio de restauração exclusivo com sementes, em área total no sistema muvuca de sementes. Nessa área foram semeadas diversas espécies de adubação verde como feijão de porco e crotalária (exóticas) com adubações verdes nativas como o Anil (Indigofera tinctoria) e diversas espécies arbóreas nativas como pau viola, jatobá, sangra d'água e outras (Figura 2).

Figura 2. Plantio realizado por semeadura direta com mix de espécies nativas arbóreas e adubação verde

O pesquisador ressaltou as vantagens do plantio por sementes, que é realizado muito mais rápido e com baixo custo e ´menor necessidade de mão de obra em relação ao plantio de sementes.  Um diferencial específico desse plantio é o uso de  espécies nativas como adubação verde (o anil por exemplo) ao invés de apenas as espécies exóticas mais comumente utilizadas.

No período da tarde foram visitados ou 2 módulos de SAF mais antigos da APTA , implantados em 2011, o SAF Pupunha  e o SAF Banana. Nesses locais falou-se sobre a importância de fechar a área com cerca viva (nesse caso cerca de margaridão) para reduzir efeito de borda e a entrada de sementes de gramíneas indesejadas nos sistemas com o vento. Conheceram as espécies exóticas ornamentais que ocupam espaços no sistema e podem ser consideradas invasoras embora realizem a função ecológica ocupando o extrato herbáceo no sistema. Também viram os rizomas de cúrcuma espalhados na área que se desenvolvem espontaneamente com o início das chuvas, podendo ser colhidos todos os anos sem a necessidade de replantio posterior.  Em ambos os módulos, as bananeiras plantadas inicialmente foram retiradas do sistema devido ao sombreamento proporcionado com o avanço do desenvolvimento das árvores nos sistemas (Figura 3).

Figura 3. Visita ao SAF Pupunha.

Ao final conheceram o horta/coleção de PANCs apresentada pela pesquisadora Cristina Castro com diversas espécies que toleram sombra e podem ser cultivadas nos sistemas agroflorestais, e o banco de sementes de adubação verde podendo conhecer as diversas espécies e suas aplicações na restauração florestal.



9 de out. de 2021

ENTREVISTA com GOURA LILA DEVIDASSI PARA O PLANO DE AÇÃO DA REDE AGROFLORESTAL DO VALE DO PARAÍBA

Data:10/04/2021 - 9h

Local: on-line, Fazenda Nova Gokula, Pindamonhangaba.

Entrevistado: Goura Lila Devidassi - produtora agroflorestal 

Entrevistador: Patrícia Lopes - Pesquisadora

Esta entrevista com Goura Lila Devidassi (Figura 1) traz informações sobre a produção agroecológica de Nova Gokula, em Pindamonhangaba e as prioridades para a Rede Agroflorestal trabalhar. Boa leitura.  


Figura 1. Goura Lila Devidassi, em Nova Gokula, Pindamonhangaba - SP.

Bom, bom dia, meu nome é Patrícia. Estou aqui conversando com a Goura. Peço agora para você, por favor, me dizer seu nome completo.

Gilcelia Aparecida Gonçalves, o nome civil. E o meu nome espiritual é Goura Lila Devidassi.

Você está sediada em qual município?

GOURA: Pindamonhangaba. No bairro do Ribeirão Grande, na fazenda Nova Gokula.

Como que você chegou até a vida no campo, de produção rural, se você sempre viveu aí e qual foi o caminho para chegar até aí, nesse formato de vida? O que te motivou a fazer essa escolha?

GOURA: Eu vim para Nova Gokula em 2009, para fazer um trabalho de adequação ambiental para a fazenda Nova Gokula e comecei essa caminhada não como agricultora mas fazendo esse trabalho de articulação perante os órgãos ambientais, para regularizar algumas pendências ambientais que a Nova Gokula tinha na época. E em 2013 eu conheci o pessoal da Rede Agroflorestal, com o Antonio Devide e a Cristina (Castro - pesquisadora), e o pessoal do assentamento. Também vi a nossa carência de sustentabilidade e de apoio na área, para as famílias de baixa renda de Nova Gokula, e comecei a me engajar nesse movimento com parceria com o sindicato rural, na época era a Lucila Rangel. Fiz uma parceria com eles e trouxe um curso de capacitação, de olericultura orgânica para a Nova Gokula. Porque o devotos não tinham muita aptidão para a terra, achavam que era muito difícil plantar, mas através desse primeiro curso que eu consegui, eles viram que era mais fácil. E em 2014 o Antônio Devide trouxe um mutirão agroecológico, agroflorestal, aqui para a Nova Gokula (Figura 2). Aí comecei e não parei mais. Peguei gosto!

Figura 2. Mutirão agroflorestal realizado em 04/12/2014 na Fazenda Nova Gokula.

Como é que funciona a organização aí de vocês, né? Como é que existe uma organização mínima, de construção coletiva de esforços para mudanças que são necessárias, tanto na propriedade que você está inserida, quanto no entorno, com as outras propriedades do Ribeirão Grande? Existe uma articulação, tem uma liderança, tem um movimento que funciona ou que não funciona? Como é essa organização?

GOURA: Aqui a gente tem uma coordenadoria de agricultura e de proteção aos bovinos. Ela é institucionalizada e eu faço parte, sou a coordenadora. A gente trabalha com agricultura familiar, e com agricultura nas áreas que são da instituição. Nessas áreas institucionais, geralmente a gente planta em maior escala e a gente fomenta a agricultura familiar para fortalecer as famílias que tem essa aptidão, porque nem todos tem essa aptidão. A gente faz esse trabalho. Em relação ao entorno, eu conheço algumas pessoas, mas ainda não existe uma liderança, com alguns encontros pontuais. Isso é uma carência, apesar de existirem alguns agrofloresteiros por aqui. Tem o sr Fernando, a Marilda, a Angela, a Daniela Querido que é aqui do lado, e um outro pessoal. Tem o Vivaldo, o seu Antônio, o Claudio Macedo, que a gente também tem essa parceria com o entorno. Fazemos algumas trocas, mas a gente não tem nada formalizado e constituído, de uma forma que tenha encontros pontuais, ou alguma organização melhor. A gente tem também o apoio do pessoal que é do bairro, que a presidente e a vice que tem essa vontade de trazer algum projeto sustentável para os jovens do Ribeirão, algo agroecológico e agroflorestal. A gente até chegou a conversar sobre isso, mas entrou a pandemia justo quando apareceu o Instituto Auá, que começou esse movimento do entorno mais forte. Mas logo em seguida começou a pandemia e a gente sessou todos os trabalhos. Nesse momento, estou trabalhando com voluntários em Nova Gokula, nas áreas, e a gente está na caminhada.

E o que que você vê de importante na agrofloresta, nesse formato de produção agroflorestal?

GOURA: O que me interessou foi a diversidade, por que eu acho ser muito rico, a questão de inibir doenças e pragas, por ser um sistema que é mais saudável, é uma harmonia para todas as espécies inseridas, e acho a facilidade do manejo. Porque você já faz um consórcio com a sua necessidade do seu plantio, e isso minimiza bem o tempo de ter que trazer insumos de fora, ou comprar insumos. No começo é um pouco trabalhoso mas o que estou vendo com a minha experiência é que a longo prazo, ele é sustentável. E você sempre está colhendo alguma coisa, tem sempre produtos pra você colher. Isso é uma riqueza que me inspira muito na agroflorestal, na agroecologia.

E como que você define a Rede? O que que é a Rede Agroflorestal para você?

GOURA: Para mim a Rede Agroflorestal representa o apoio, que a gente tanto precisa e ela representa a sabedoria que eu adquiri, através da Rede. Quando eu comecei eu não sabia nada e através dos mutirões, muitas das vezes em consultorias com o Antonio Devide na APTA (Polo Regional Vale do Paraíba, setor de fitotecnia, 2GJW+9P Pindamonhangaba, São Paulo), eu fui adquirindo conhecimento. A Rede, pra mim, é muito importante na questão do aprendizado e na questão de fornecimento de sementes e mudas. Os mutirões também são muito ricos porque eles trazem essa ajuda que falta para o agricultor que trabalha sozinho. Pra mim, a Rede é essencial. A existência dela é muito significativa. E estou na Rede desde 2012, desde que começou eu estou participando. Não tão intensamente mas... Eu vi que ela transformou muitos lugares. Transformou muitas pessoas. Nos dias de hoje, onde a gente tem tantas áreas degradadas, tanto alimento contaminado, a Rede Agroflorestal trouxe esse alívio de produção de alimentos com qualidade, pessoas capacitadas. Pra mim, a Rede é essencial que permaneça, que exista.

A outra pergunta é mais ou menos o que você já respondeu, mas se você tiver mais alguma coisa para complementar, da forma como você vê a atuação da Rede Agroflorestal, até o momento.

GOURA: A Rede é essencial. O suporte que ela nos dá. Pra gente que está na área rural, é grande. A Rede é muito importante, apesar de eu achar que precise acrescentar alguns pontos, mas todo o trabalho que a Rede fez é muito importante pra mim. Trouxe sustentabilidade, trouxe esse aprendizado nas áreas de pesquisa da APTA, que a gente pôde vivenciar. A Rede fez um trabalho muito bonito, com muito esforço, com muita dedicação... então a Rede pra mim, sinceramente, é uma luz no fim do túnel. Para mim e para o entorno. Tantas pessoas que eu vi crescer, que eu vi transformar através da Rede, é muito importante.

O que que você vê como importante para ser trabalhado para ser desenvolvido daqui para frente? Para os próximos anos, o que a Rede precisa se preocupar, quais as demandas? O que que você vê que falta e que precisa melhorar?

GOURA: Uma coisa que pode melhorar são as visitas técnicas nas áreas que tem SAF implantados, principalmente SAF que são iniciais, que a pessoa não tem muita experiência. Uma outra coisa que tem muita carência é a questão do mercado de venda. A gente geralmente tem a fragilidade financeira e precisa criar esse mercado de rede agroecológica, que hoje não existe. E também que precisa trabalhar a questão do traslado. Como esse pequeno produtor pode chegar com seus produtos até as cidades... São Paulo, São José, Taubaté... isso é uma coisa que precisa. Não adianta só plantar. Se você não consegue vender tudo que você planta, para traze a sustentabilidade pra onde você está, acaba que fica um pouco amarrado. Trabalhar a questão do mercado, criar uma rede de colheita. Para poder estar trocando esses produtos, e a questão do traslado, que é muito importante. Fazer chegar até os pontos de entrega o produto da agrofloresta.

Tem alguma outra coisa, no dia a dia de vocês?

GOURA: Eu acho que no meu dia a dia, a Rede precisaria de desenvolver maquinários para agrofloresta. Ex: o tronco da babana é muito legal, mas vai você que é mulher cortar um tronco da banana pra você ver... A Rede poderia ter esse olhar, entendeu. Desenvolver uma ferramenta, como já existe no mercado mas a Rede poderia ter essa produção, que a gente pudesse comprar ou algum produtor da Rede entrar nessa linha. Ex: ter uma motosserra menor, ter esses maquinários. A gente sabe que tem no mercado para vender, mas às vezes, na nossa região não tem. Igual a um ferro que corta os troncos da banana, que é muito prático, mas nem toda a serralheria faz esse tipo de equipamento. Seria legal. A fazenda da Toca (de Itirapina - SP), eles desenvolveram esse maquinário para a agrofloresta. Acho que é muito bacana se a Rede tivesse esses equipamentos, porque muitas das vezes a gente não trabalha com muitas pessoas e isso facilita o manejo, ajuda muito. Essas são minhas sugestões.

Importante ter essa fluidez... de produção de manejo, de venda...

GOURA: A gente precisa fechar o ciclo, né... plantar, manter, aprender, colher, processar e vender. Tem que fechar esse círculo. Não dá só para plantar. Atualmente é a minha dificuldade. Às vezes você perde produto porque estou a 26km de Pinda e é difícil o acesso, não tenho carro, enfim.. precisa de fechar esse círculo. Trabalhar com esse olhar. Seria legal a Rede também ter o seu selo, uma plataforma de venda, ter um estande que vai para essas feiras nacionais e internacionais, desenvolver de fato um olhar de empreendedorismo.

Agradeço muitíssimo.

GOURA: Eu que agradeço!