16 de nov. de 2022

Mutirão Sítio Canto do Caetê, Catuçaba, São Luiz do Paraitinga

Milho, feijão abóbora, arroz, amendoim e mandioca

15/11/2022


Por: Denise Lotito - Educadora em metodologias de ensino, em formação para se tornar agricultora agroecológica



Estou no sítio há 6 meses apenas, e vim com a intenção de me tornar agricultora agroecológica, realizando também plantio em sistema agroflorestal e de acordo com os princípios da agricultura biodinâmica. Para esse primeiro plantio, resolvi iniciar com o tradicional consórcio milpa (milho, feijão e abóbora)


Somos totalmente inexperientes na agricultura, e por isso decidimos começar com consórcios simples para, aos poucos, conforme ganhamos experiência e conhecimento, avançar para um sistema agroflorestal.


Quando souberam que eu finalmente iria iniciar o plantio, alguns amigos agricultores experientes, envolvidos com agrofloresta, se ofereceram para me ajudar a viabilizar essa primeira plantação do sítio. Foi muita gentileza deles. Sem eles, eu teria tido muitas dúvidas, talvez teria feito várias bobagens, além de que iria demorar uns três dias para fazer o que fizemos em um único dia. 


Vieram me ajudar Lorivane e Haydé, do Sítio Minha Estância, Assentamento Manoel Neto, de Taubaté; Luciano, Assentamento Nova Esperança; Lucas; Cleide e meu marido Alexandre.


Como ganhei sementes crioulas de arroz de sequeiro, de amendoim colorido e também ramas de mandioca de uma família da região, resolvemos incluir esses itens no consórcio. E para gerar matéria orgânica no futuro e para dar mais alimento para as numerosas formigas que temos aqui no sítio, a ideia foi plantar feijão guandu, feijão de porco, girassol e crotalária ao redor da área, sementes que eu tinha na geladeira e que o Lorivane achou no carro dele (que sorte!). As ideias foram aparecendo e se multiplicando, e meu tradicional milho, feijão e abóbora ficou  incrementado com elementos sugeridos pelas particularidades do sítio, da área de plantio e da disponibilidade de sementes. 


Para preparar a terra, foi feita no final de maio uma adubação verde de ervilhaca, aveia preta e nabo forrageiro. Esse plantio não foi muito bem sucedido. As plantas ficaram baixas, e não geraram muita matéria orgânica. Acreditamos que foi a falta de chuva. Mesmo assim, roçamos esse plantio e incorporamos na terra com tratorito.


Orientados pela análise do solo, decidimos corrigir a terra com 100 gr de termofostato e 100 gr de calcário por m2. Além disso, distribuir 3 kg de esterco por m2 e fazer cama morta em toda a área, que tem um total de 700 m2.


Tudo isso foi feito da seguinte forma: roçamos a adubação verde e aplicamos o preparado biodinâmico fladen, que favorece a decomposição da matéria orgânica. Aplicamos temofosfato e incorporamos na terra com tratorito e deixamos descansar 15 dias. Em seguida, fizemos o mesmo com o calcário e mais 15 dias de descanso. Quanto ao esterco e à cama morta, tivemos que mudar de planos: a quantidade de esterco para cobrir toda a área ficaria muito caro, e a palha para cobrir tudo também seria inviável pela quantidade de trabalho. Então a decisão foi fazer uma mistura de esterco (5 partes), torta de mamona (1 parte) e cinza (½ parte) e lançar diretamente nas leiras e berços, em vez de lançar na área toda, como era a ideia inicial. O ideal teria sido adubar com o composto biodinâmico, mas ele ainda está em preparo e por isso não pudemos utilizá-lo. Para cobertura do solo, decidimos cobrir apenas as linhas onde foram plantadas as mudas de milho, com braquiária que roçamos no dia da plantação, em área vizinha à área da plantação. Abrimos todas as leiras de milho primeiro, jogamos o preparado de adubo, cobrimos com a palha, e abrimos os berços por entre a palha. Depois fizemos os berços para as linhas de feijão, arroz, abóbora e amendoim, e adubamos cada berço, sem cobrir com palha.


Escolhemos traçar as leiras na direção leste/oeste e foi feito o seguinte esquema:

  • na beirada, uma linha de feijão guandu, feijão de porco, girassol e crotalária, bem adensada;

  • uma linha de milho + 2 de feijão +1 de abóbora (repetindo 3 vezes);

  • uma linha alternando milho e mandioca (que foi plantada deitada), sendo uma mandioca a cada 2 milhos, duas linhas de feijão e uma de abóbora (repetindo 2 vezes);

  • uma linha de milho + 4 de arroz de sequeiro;

  • uma linha de milho + uma linha de amendoim colorido;

  • fechando com uma linha de crotalária e uma linha de feijão guandu, feijão de porco e girassol.



As distâncias entre linhas foi de aproximadamente 45 cm, o que somou 1,80 m entre cada linha de milho. A distância entre plantas na linha foi de 20 a 25 cm.


Os milhos foram plantados de muda preparadas no próprio sítio 15 dias antes. A semeadura do milho foi feita em dia de fruto do calendário biodinâmico, seguida de aplicação do preparado chifre esterco, que favorece o enraizamento. O substrato foi preparado no sítio, com húmus, casca de arroz, termofostato e calda de microorganismos da mata.

Foram 2 sementes de feijão por berço

Várias sementes de arroz por berço

Amendoim plantado em leira com espaçamento de 10 a 15 cm por semente

Abóbora a cada três metros na linha 


Por uma questão de agenda do grupo, acabamos plantando em dia de folha, algumas horas antes do início do dia de fruto, segundo o calendário biodinamico, o que não é adequado para uma plantação de grãos. 


No dia seguinte ao plantio aplicamos o preparado biodinâmico chifre esterco em toda a área, para enraizar melhor. Como era de de fruto, ele vai compensar o fato de termos plantado em dia de folha.


O próximo passo será plantar bananeiras ao longo das linhas laterais, para gerar biomassa para os próximos plantios na área.


Agora é esperar o resultado. Que, depois de tanto amor e dedicação, só pode ser positivo.


Imagens: Denise Lotito, Haidê Ludmila dos Santos, Lucas Lobo e Luciano Correia dos Reis  

Edição para o blog: Antonio Devide - pesquisador


7 de nov. de 2022

SOLIDARIEDADE no 'Mutirão Agroflorestal de Plantio de Arroz Orgânico' no Assentamento Manoel Neto, Taubaté/SP

Por: Denise Lotito - Educadora em metodologias de ensino, em formação para se tornar agricultora agroecológica


Escolhi fazer este relato em primeira pessoa porque o que vi no mutirão tocou muito mais a minha subjetividade do que minha objetividade. 

Dia 19 de outubro de 2022. Amanheceu chovendo. Será que vai ter mutirão mesmo assim? Daqui de casa seria pouco mais de uma hora de carro. Peguei minha capa de chuva, meu chapéu e saí atrasada. 


Quando cheguei as pessoas já estavam terminando o café. Uma mesa linda cheia de bolos, pães, geleias, pastinhas, que os participantes haviam trazido. Me esforcei para parecer que estava à vontade, mas estava um pouco encabulada porque não conhecia quase ninguém além dos donos da casa, e vi que as pessoas ali já se conheciam bem, faziam parte de um grupo. Eu havia conhecido a Ana e o Mineiro duas semanas antes, num curso de três dias no sítio do Valdir @sítioecológico.


Como eu estava interessada em aprender a plantar arroz, e o mutirão seria de SAF consorciado com arroz orgânico, eu aceitei na hora o convite para o mutirão. Apesar de nos conhecermos tão pouco, a Ana e o Mineiro me receberam com muita alegria, como se fôssemos velhos amigos. Vai ver que velhos amigos são assim mesmo, não tem nada a ver com o tempo que a gente se conhece, mas com o carinho que estamos dispostos a trocar. E pra mim aquele era um momento de carinhosa generosidade. Eu queria aprender. E sabia que aquele conhecimento que eu iria usufruir ali, fruto da experiência do trabalho daqueles agricultores, era um bem muito valioso, que eu estaria recebendo. Um bem que valia muito mais do que toda a colaboração que eu poderia dar no mutirão. Por isso, mais que minha força de trabalho, eu levava a vontade de encontrar modos de retribuir essa generosidade.


Depois do café fizemos uma roda e as pessoas se apresentaram. Foi aí que Ana contou que estava muito emocionada com a presença de todos ali, vindos para ajudar a família a reconstruir a plantação que o fogo havia destruído um ano  exatamente no dia 7 de setembro de 2021. E essa mesma oportunidade foi dada a diversas pessoas ali presentes, cada um com um agradecimento diferente, mas todos emocionados. Aí percebi que não era só eu que estava agradecida. O que estava acontecendo ali era um encontro de pessoas que tinham algo para dar umas para as outras. Um encontro de trocas, baseado em companheirismo.


Havia 21 pessoas adultas e 4 crianças participando, fosse no plantio ou organizando as refeições. Estavam presentes representantes do Sítio Monte Coruscante, de Conquista, da Cati, Sítio Guajuviva , Sitio Beija Flora , Sítio das Orquídeas, Assentamento Olga Benário, Assentamento Nova Esperança, Sítio Ecológico, Mineto, Instituto Auá, Rede Agroflorestal, Assentamento Egídio Brunetto, Cooperativa Coomatre. Assentamento Conquista, Coletivo de Coletores de Sementes do Vale do Paraíba, amigos e familiares. 


Após as apresentações, o Valdir Martins explicou o conceito do SAF que iríamos implantar: uma linha de frutíferas com árvores de serviço, uma linha de milho com feijão semeados no mesmo berço, duas linhas de arroz. Explicou que tínhamos árvores maiores, as mangueiras, que seriam plantadas a cada dez metros. Entre elas, as estacas de gliricídias (árvore para poda) plantadas inclinadas a 45º para evitar danos pelo sol, e as outras árvores do estrato médio (na maioria eram frutíferas nativas e exóticas) e do estrato alto (árvores nativas como jatobá, cedro, araribá e outras), além de algumas emergentes.


Então subimos para a área de plantio. Começamos para passar a linha por orientar os berços. Depois de esticada a linha, as pessoas se dividiram nas tarefas: com motocoveadores e cavadeiras começaram a cavar os berços para as mudas; com a enxada, cavar os berços para as sementes; jogar composto nos berços, lançar as sementes de milho, feijão e arroz. 



A chuva, que no começo do dia ameaçava atrapalhar o trabalho, acabou não caindo. O dia permaneceu nublado, o que foi de grande ajuda, pois o terreno era íngreme, tornando o trabalho mais penoso, mesmo sem sol.



Naturalmente as pessoas foram se distribuindo nas tarefas, de acordo com suas habilidades e desejos, e logo todo o trabalho estava fluindo de forma muito organizada, como num formigueiro, como se cada um soubesse com muita clareza qual tarefa lhe cabia, sem atropelamentos, sem confusão, um completando o trabalho do outro, ajudando quando necessário, com muita harmonia e alegria, num coro de risadas e conversas animadas.

Todo mundo interessado em conhecer sobre as plantas, sobre as formas de semear, trocando informações sobre suas experiências de plantio. O mutirão foi assim: as pessoas trabalhando com satisfação, pelo prazer de construir juntos. 


Ao final, descemos o morro, olhamos pra cima e contemplamos orgulhosos o trabalho realizado. Nossa, olha só tudo o que fizemos! Nem parece verdade que plantamos tudo isso!  Estávamos felizes, orgulhosos, e nos sentindo como se fôssemos todos velhos amigos!



Inicialmente foi feito o croqui abaixo: 



No entanto, como é normal acontecer, devido às circunstâncias, que quase nunca são correspondem exatamente ao planejado, o croqui foi adaptado para o seguinte formato:



A área cultivada / implantada foi de aproximadamente 5.000 m², com os seguintes índices aproximados de plantio:


  • Quantidade de berços cavados: 14.793 berços plantados e semeados
  • Quantidade de mudas plantadas: 1.042 mudas arbóreas e frutíferas
  • Quantidade de estacas: 417 estacas de gliricídia
  • Quantidade de milho e feijão semeado: 4.1667 berços de feijão de 60 dias consorciado com milho
  • Quantidade de arroz semeado: 8.333 berços de arroz
  • Quantidade de berços de muvuca de sementes: 834 berços

Agricultura de montanha

A agricultura de montanha é um termo genérico que engloba diversos procedimentos para tornar compatível o uso do solo com medidas conservacionistas que aumentem a quantidade de vida consolidada. Em terrenos muito declivosos é natural o uso do solo com culturas perenes, e nas áreas com topografia suave ondulada a plana a escolha de uso com lavouras de ciclo curto, que demandam  uma maior necessidade de movimentação do solo. 

Estudo da paisagem

O estudo da paisagem é uma ferramenta fundamental e metodológica para empoderar os agricultores e agricultoras na tomada de decisão para escolha de estratégias mais adequadas de preparo do solo, de escolha do sistema de plantio, sobre a capacidade do solo de sustentar uma produção comercial, se é necessário tomar medidas prévias para aumentar a capacidade de sustentação do solo para produção agropecuária e agroflorestal, quer seja pela análise das plantas indicadoras, da resistência do solo à penetração pelo sistema radicular dessas plantas, pela necessidade do plantio de adubos verdes e culturas de cobertura previamente ao plantio de culturas de valor econômico, ou mesmo para reduzir a necessidade de adubos provenientes de fontes de nutrientes externas ou até mesmo de medidas que atuem para reduzir a resistência físicas do solo à infiltração da água como a subsolagem.

No Sítio Minha Estância a área da propriedade trabalhada no mutirão possui declividade acentuada, sendo notável na parte alta da pendente uma região de produção de sedimentos (eluviação) e na parte baixa a região de deposição (iluviação). Esse processo de perda de solo na parte alta e de deposição na parte baixa faz com que a camada interna do solo (subsuperficial) inicie cada vez mais o processo de amostra (afloramento) na parte alta. Isto foi notado com a maior resistência à penetração do motocoveador, devido à maior quantidade de argila existente no horizonte sub-superficial.

Medidas conservacionistas na agricultura de montanha
O plantio em curva de nível ou em terraços são estratégias que visam reduzir o escoamento superficial; mas tem que ter um planejamento prévio, pois a distância entre os terraços e a largura dos terraços devem ser planejados de acordo com a declividade e a classe de solo. Os cordões de vegetação perene, como sebes e cerca viva de cana, capim vetiver, capim guatemala ou mesmo leguminosas, como a espécie multicaule flemíngia, ou cerca viva de pitangueira, plantada de maneira adensada a partir de sementes, apesar de ser demorada para fechar, ainda assim forma uma cerca viva densa que reforça a infiltração da água no solo e reduz o escorrimento superficial. 

Plantio direto, cultivo mínimo e plantio em faixas também são tecnologias que estão em desenvolvimento na região e podem fortalecer a conservação dos solos. Em todos esses casos a rotação de cultivos é atividade obrigatória. Porém, no Vale do Paraíba, a estiagem prolongada no outono-inverno é o principal entrave à formação de uma camada de matéria orgânica densa para possibilitar o plantio direto subsequente com qualidade para beneficiar a lavoura comercial sem degradar o solo. As leguminosas espontâneas, regionalmente adaptadas, tais como o kudzu tropical e o labe labe, teoricamente são tolerantes à geada e a seca, podendo formar densa camada para servir de cobertura morta para o plantio direto no início da época chuvosa. No caso dos pomares perenes, o uso de cobertura viva, como o amendoim forrageiro, é outra alternativa viável que ajuda a proteger o solo da erosão. Na agrofloresta, o que mais tem sido feito é o cultivo de faixas de capim mombaça para ser roçado e a biomassa ser rastelada para ser depositada nas linhas de diversidade de cultivos a fim de formar um manto de matéria orgânica que fixa o carbono, entra em decomposição, aumenta a atividade biológica e recicla os nutrientes de camdas profundas do solo.

Extremos climáticos

Após o mutirão de plantio, um evento extremo ocorreu em Taubaté e a forte chuva de granizo degradou toda a produção de alimentos do Sítio Minha Estância. Este relato também serve para prestar solidariedade à família e pedir que as pessoas participem do processo de reconstrução da capacidade produtiva em bases cada vez mais sustentáveis. 

Relato da família:
No dia 24/10/2022 uma forte chuva de granizo destruiu quase que 100% da produção orgânica de legumes, verduras, hortaliças entre muitos canteiros que estavam sendo preparados para novos plantios, também foram danificados com a forte enxurrada.
Estima-se que os danos podem chegar a mais de R$ 20 mil reais!!!
Os produtores precisam da nossa ajuda, pois essa é a única fonte de renda da família, e para que eles possam continuar entregando produtos orgânicos, de qualidade, sem venenos e agrotóxicos, estamos promovendo essa colaboração.
Qualquer quantia será bem-vinda, R10,00...R$50,00...R$100,00...o que couber no seu bolso, irá ajudar muito nessa nova etapa de recuperação dos canteiros, compras de insumos, mudas, adubos, sementes etc...
Para quem quiser contribuir, segue abaixo o número PIX.
12991923891 - Ana Lucia dos Santos
Banco Satander
A Família Sítio Minha Estância agradece desde já 🙂
Instagram: @sitio_minha_estancia

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Colaboração e edição para o blog: Antonio Devide - pesquisador
Imagens: família Minha Estância, Antonio Devide, Denise Lotito e outrxs colaboradorxs