RELATÓRIO DA CAPACITAÇÃO
PEDAGÓGICO-PROFISSIONAL EM AGROECOLOGIA (APTA/INCRA-SP): SÍTIO DO BUGIO,
RIBEIRÃO GRANDE, PINDAMONHANGABA-SP
José Miguel Garrido
Quevedo, Engenheiro
Agrônomo, Perito Federal Agrário, Membro do Setor de Meio Ambiente e Recursos
Naturais do INCRA - SP
Verônica
Andressa de Castro,
Estudante de Graduação do curso de Engenharia Agronômica da FCA /UNESP –
Botucatu
O
módulo apresentado no presente relatório foi a “cereja-do-bolo” da Capacitação
Pedagógico-Profissional em Agroecologia (APTA/INCRA-SP). Os participantes
iniciaram seu encontro com a tradicional roda de mãos dadas. O mestre, Antônio
Carlos Pries Devide, explanou sobre sua conexão com a região e sua propriedade.
Sentiram que não iriam para um lugar qualquer. Um renque de juçaras era sinal que
estavam indo ao paraíso.
Na roda de abertura, o mestre
revelou a dimensão espiritual que o lugar tem a ele e sua família. Talvez um resgate de um tempo pretérito. Uma
fazenda onde a senzala reinou, lugar do berço de duas plantas sagradas para o
candomblé, o lírio-do-brejo e lágrimas-de-nossa-senhora, em que suas
sementinhas eram utilizadas na elaboração de colares para rituais e enfeites.
A dimensão material é um lugar de
encontro entre amigos. Lugar onde o convívio mais íntimo revela que pertencemos
a uma mesma família. Ligação de hermanos.
Seres afins que se encontraram para trilhar o caminho da agrofloresta neste
plano, nesta dimensão chamada Terra. Iniciaram o passeio observando a paisagem
na imensa diferença entre o Pico na Mantiqueira e o Fundo do Vale, onde estavam
os participantes. Um lugar do reino das águas, onde o saber conviver com a dinâmica
hídrica é fundamental. A localização da residência é em território longe da
enxurrada. É minucioso e preciso. Aqueles tijolos antigos, daqueles que não
encontramos mais, a argamassa com mais barro, o chão ”amarelão”, as janelas de
demolição, as venezianas antigas de vidro, remeteu a sensação de estarem em um
templo. Uma catedral do saber.
Imóvel rural construído com materiais reutilizados, sucata metálica; madeiras, tijolos, portas e janelas de demolição; pneus, pedras e garrafas. |
Caminhando pela extensão do lote,
terreno da família, encontra-se o jardim de árvores já desenvolvidas, dois pés
de gravitinga e alguns citros carregados com limões-cravo. Uma imensa moita de
bambú. Parecem saudar a quem visita o local, dando as boas-vidas para adentrar
na mata à dentro.
Chegando à beira do rio, uma área da APP onde a dinâmica de força das águas revela todo o seu poder. Arrastam o que tiver pela frente nos tempos das águas. Uma APP com árvores adultas e havia a presença de plantas formadoras de “pele”, o capim lágrima-de-nossa-senhora e o lírio do brejo. Funcionam como verdadeiros cílios a umedecer as pupilas das águas. Um riacho de águas límpidas e frias que vem da montanha, arrastando as pedras que estiveram pelo caminho. Na beira do rio está sendo introduzido o margaridão que devido ao seu desenvolvimento em touceiras consegue conter a força das águas.
Chegando à beira do rio, uma área da APP onde a dinâmica de força das águas revela todo o seu poder. Arrastam o que tiver pela frente nos tempos das águas. Uma APP com árvores adultas e havia a presença de plantas formadoras de “pele”, o capim lágrima-de-nossa-senhora e o lírio do brejo. Funcionam como verdadeiros cílios a umedecer as pupilas das águas. Um riacho de águas límpidas e frias que vem da montanha, arrastando as pedras que estiveram pelo caminho. Na beira do rio está sendo introduzido o margaridão que devido ao seu desenvolvimento em touceiras consegue conter a força das águas.
Atravessaram o rio e sentiram uma
força e frieza. Adentraram na vegetação ceifada, onde há os lírios-do-brejo,
que no passado eram utilizados como cama de negros, vinculavam-se ao sofrimento
vivido naquelas terras e que agora tal vegetação cobre o solo, formando uma
“cama” vegetal, que será cultivado na agrofloresta. Chegaram ao primeiro módulo
de aprendizado desta etapa. Um SAF de bananas e árvores nativas, entre elas a
juçara, nas linhas de diversidade. O mestre revelou que a maioria do que foi
plantado serviu de comida para a natureza. Uma família de porcos selvagens fez
ali sua moradia, deliciando-se do banquete oferecido. São raízes e caules
suculentos que serviram a sua família. Vimos a “cama” lamacenta formada em seu
ninho. Algumas bananas sobreviveram, assim como algumas nativas plantadas
também.
A linha central, formada de um
canteiro de lírios ceifados, mostra o trabalho do mutirão anterior. Assim foi
dada a tarefa do dia: capinar a linha de diversidade, fazendo sobreviver as
poucas mudas remanescentes. São ramas de mandioca, ramas de batata doce, mudas
de banana e poucas mudas de nativas; limpeza do terreno, retirando os lírios do
brejo a facão no solo, arrancando os brotos com raiz.
A
linha de diversidade é limpa para receber sementes de adubos verdes que entrarão
no sistema. Salientamos a troca de informações entre os discípulos-mestres. É o
momento de mutirão, em que, com a enxada na mão, conversaram entre pares
trocando saberes e experiências na labuta do trabalho entre os
agrofloresteiros.
Roçada do lirio para cobertura do solo. Plantio de mudas de frutíferas entre bananeiras. |
Enquanto
isto, o mestre foi abrindo fronteiras ceifando os lírios mata à dentro,
aumentando seu território de ação sobre a natureza e, assim, planejando
futuramente novos módulos de produção.
No
intervalo, o mestre nos explicou o princípio do Sol naquele território sagrado,
beneficiando o desenvolvimento de mais plantas no local. Encontra-se no local
alguns ninhos de jacú espalhando mudas de juçara em sua sombra.
Os participantes
deslumbraram a importância desta planta na cadeia trófica. Percebemos como é
semeada a natureza. É o plantio pelo Mestre. Uma árvore adulta no centro, as
juçaras como carro-chefe do sistema e ao redor da planta-mãe, a mão do homem
fazendo criar natureza, assim serão organizados os novos SAFs, tais como
mandalas. Entendemos a franja formada, o tal renque de juçaras que vimos ao
adentrar neste paraíso.
Mudas de palmeira juçara (Euterpe edulis Mart.) crescidas a partir de sementes dispersas pelo jacú (Penelope) abaixo da copa de uma quaresmeira (Tibouchina granulosa) utilizada como poleiro. |
Hora de conversa, um dos discípulos-mestre
Marcos Marsicano nos presenteia com a apresentação de princípios da agricultura
biodinâmica, a agricultura que está interligada ao cosmo, em sintonia com o
universo. Explana sobre os preparados biodinâmicos preparados e dispostos em “chifres”
de bois, os cornos, é nos explicado o preparado do esterco bovino e o preparado
à base de sílica, necessário para trazer o cosmos paa o sistema, que está muito
ancorado nos elementos ‘terra-água’, veja bioindicadores ‘porcos’. Uma aula à
sombra da árvore guia crindiúva. É nos revelado às forças da Natureza.
É tempo de retornar para o almoço abençoado.
A delicadeza do arroz com batata doce e o feijão temperado com coentro, ambas
as misturas oriundas de assentamentos, nos presenteiam com a riqueza do sabor.
A união é marcante neste momento sagrado: a refeição elaborada de forma
colaborativa. Renovaram suas energias, alimentando suas almas, ao observarem o
cume daquela montanha que parece alcançar o céu.
Almoço na lenha e na pedra. |
Pausa para o café, café de marca
regional, mostrando-os que estavam no coração do Vale do Paraíba. É tempo de
refletir os rumos que a Rede Agroflorestal do Vale do Paraíba irá seguir. Quais
encaminhamentos tomar, quais as providências cada um vai assumir. Quais os
próximos passos.
Despediram-se com um abraço, pelo
dia de aprendizado e compartilhamento de sonhos e ideias. Hora do repouso
merecido, abaixo do céu estrelado, recordando o momento vivido. Subiram um
degrau do saber, desta agricultura que respeita a Vida, que respeita a Deus. Fecho
este relato, com a caneta da APTA nas mãos, neste primeiro dia de vivência,
neste templo sagrado do Saber.
Adaptação para blog - Antonio Calos P. Devide - Pesquisador da APTA
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