MUTIRÃO AGROFLORESTAL
NO OLGA BENÁRIO - dia 21 de setembro de 2019 – Tremembé - SP
Plantio de árvores nativas na área da sede do Assentamento Olga Benário em
Tremembé/SP.
O objetivo foi comemorar o dia da árvore com o plantio de espécies nativas na
área sede do assentamento. A atividade reuniu agricultores e agricultoras familiares. Ao final foi oferecido refeição com produtos locais. Quem participou levou mudas para plantar, prato, talher e caneca
para refeição, para evitar usar descartável.
Texto elaborado por: José Miguel Garrido Quevedo, Engº Agrônomo, Perito Federal Agrário, Membro do Setor de Meio Ambiente e Recursos Naturais do INCRA - SP
Reunião para estudo da paisagem e novos ensinamentos com a troca de infirmações e apresentação das experiências de agricultores pesquisadores de sistemas agroflorestais. |
A forma de trabalhar a instalação e manutenção dos sistemas agroflorestais reúne ingredientes que a Rede Agroflorestal proporciona e traz aspectos que funcionam como um fermento na confecção de um bolo de aniversário que funciona como liga social. Assim vejamos:
Foi
realizado num espaço dedicado ao coletivo, mola mestre que impulsiona a união e
luta que estas famílias enfrentaram pela luta pela terra, liga que une a
trajetória destes agricultores. Foi lá que estas famílias de camponeses
traçaram a maioria das “agonias” e “vitórias” que a conquista pela terra
proporcionou.
Este
dia de festa e trabalho uniu os jovens, as mulheres, os homens, crianças de
colo do Assentamento e colaboradores que auxiliam no desenvolvimento daquele
assentamento, a saber: a religiosidade esteve presente com a contribuição do
pastor Aparecido que auxiliou na reunião e estímulo para aquelas famílias
participarem daquela ação, um casal jovem, a Luciana e o Gustavo, que acompanham
o desenvolvimento das famílias, esteve presente, assentados de outros projetos de
assentamento do Vale do Paraíba e este servidor se uniram nesta empreitada,
chamado por estas famílias referência, a família do Valdir Nascimento e as jovens
Michele e Roseli, lideranças do bem, desta comunidade. O objetivo do encontro:
revitalizar aquele espaço simbólico de luta: a sede daquele movimento social
pela reforma agrária.
Congregando
este movimento, a presença de um militante experiente, sua companheira e seu
filho, a família do Valdir Martins, nosso instrutor, que nos conduziram neste
dia de aprendizado em Sistemas Agroflorestais com a finalidade de formarmos um
bosque neste portal do território desta “Terra Prometida”.
Agricultor agrofloresteiro do Sítio Ecológico do Assentamento Nova esperança, de São José dos Campos-SP |
De
mãos dadas em roda, saudamos o dia abençoado, os céus nos deram uma trégua no
calor dos últimos dias, nos presenteando com um dia mais ameno, como que nos oferecendo
o dia para instalarmos este tipo de agricultura que respeita o Criador. A terra
a espera de um auxílio, ela que nos dá o ar para respirar, desde que nascemos,
a água para dessedentarmos, o alimento para nos sustentar, e permitir a
construção do lar que possuímos. Estava à espera de um auxílio para garantir a
prosperidade que nos permite o aprendizado e a evolução.
Roda de apresentação e de gratidão pela oportunidade de dar início aos trabalhos. |
De
ferramentas em mãos, os homens e jovens iniciaram sua tarefa, o ceifar do capim
braquiária e a poda de árvores nativas, ambos fornecem a matéria orgânica
necessária para a proteção da umidade e formação de solo, estimuladores de vida
neste Sistema. E com as enxadas, abrir as aléias, onde serão cultivadas a mudas
e sementes plantadas neste dia.
Início dos trabalhos: roçada seletiva do mato, abertura de aleias para o plantio de árvores e culturas agrícolas. |
Outro
aspecto proporcionado neste tipo de trabalho, o mutirão, somando-se as mudas
produzidas por esta família referência, se uniram estacas de plantas de
serviço, aquelas que também servem para alimentar o Sistema, que ao serem manejadas
no futuro, alimentarão a vida. Foram trazidas pela família de nosso instrutor.
Fazem parte destas espécies a gliricídia, a amoreira, a acateia e o boldo-do-chile.
Somadas a estas plantas de serviço, foram trazidos rizomas de batata yacon e
inhame, alimentos que cuidam de nossa saúde.
Mudas de árvores nativas e estacas foram utilizadas no mutirão de reflorestamento ecológico. |
A
divisão de trabalho foi proposta: algumas famílias foram abrir os caminhos onde
seriam plantadas as mudas, as aléias, com a capina da braquiária, outras foram
pegar no viveiro do Valdir Nascimento, as mudas que comporão nosso SAF, outros
realizaram a limpeza do terreno ao redor da sede, com as roçadeiras e moto serras.
Aqui
o primeiro aprendizado do dia, o manejo do facão para preparo das estacas, elas
necessitam de um cuidado especial, nos orienta o Instrutor Valdir Martins, tem
sua extremidade desprezada, o corte em bisel, 45º, tem a casca levemente
cortada, as bordas são aparadas e a extremidade apontada formando uma ponta no
cerne da estaca. O aparo das bordas serve para elas não se deslocarem quando
enfiadas no solo, caso contrário deixarão de germinar, pois é na casca que saem
as raízes que proporcionarão o pegamento das estacas. Um detalhe importante
para a eficiência desta operação. Ação realizada com maestria pelo filho de
nosso Instrutor. Um novo aspecto revelado, as estacas de menor calibre são
também aproveitadas, e tem tido bom resultado de pegamento, segundo a
experiência de nosso Instrutor. Mais adiante, quando da instalação das estacas
no solo, como veremos a seguir, vimos que são plantadas de forma oblíqua nos
berços, importante para a incidência dos raios solares sobre as gemas que
originarão os brotos da futura planta. Veremos a seguir que ao ter o solo
coberto nos berços formados pela enxada ou cavadeira tem que ser apertado com
as mãos ou com o auxílio de um pedaço de tronco, para ter o solo úmido ligado à
estaca, esta retirada do ar permite também o sucesso no pegamento das estacas,
se é claro, houver no solo, a umidade necessária para a brotação das raízes e
gemas.
Jovem se prepara para o plantio de estacas de gliricídia (Gliricidia sepium). |
Ruas
de plantio aberto pela capina rente da braquiária, o solo é exposto pelo
trabalho bem feito daqueles agricultores, neste cultivo em aléia. Os berços são
perfurados a uma distância de 3 metros, um berço do outro. De 20 centímetros de
diâmetro por 30 centímetros de profundidade. Estas aléias formam caminhos de cerca de 1
metro de largura e nas entre ruas, como podemos nos referir, uma distância de 2
metros, onde a braquiária foi mantida.
Nosso instrutor nos presenteia com um
conceito importante, esta cultura “pele” fornece uma informação da “idade” e
“maturidade” ao Sistema Agroflorestal, se deixado como está, maduro, indica que
as mudas não necessitam crescer, ficando “enfezadas” não desenvolvendo. Já se
houver o trabalho de ceifa desta braquiária “entre ruas”, esta operação mandará
um recado ao Sistema como um todo, ao brotar novamente, estimulam todas as
mudas ao redor, se desenvolverem, soltando brotos. Esta ceifa, que deve ser
realizada constantemente, serve também como formadora de solo, já que as folhas
sendo decompostas, ricas em celulose, servem para a formação do húmus do solo.
Nosso
Instrutor mostra a intimidade com os Sistemas Agroflorestais: é necessário que
as mudas sejam identificadas, como são conhecidas entre os agricultores, caso
contrário a floresta não pertencerá ao vocabulário daqueles agricultores, seu
conhecimento, suas propriedades fitoterápicas, servem para garantir a
proximidade do agricultor ao Sistema. É uma forma de apropriação da floresta,
uma forma de se fazer pertencer ao Sistema Agroflorestal. Nos releva também
para um fator decisivo neste processo de apropriação. A necessidade de além de
árvores, seja de madeireiras ou frutíferas, estarmos trabalhando com alimentos
de ciclo curto, esta produção de quiabo, como foi introduzido neste Sistema,
garantirá o estímulo necessário para aqueles agricultores manejarem a área,
estarem presentes e neste convívio, estabelecerem laços com esta forma de
praticar agricultura. A instalação do inhame e da batata yacon também apresenta
esta função, ao retirar alimento ali, vão se formando os laços afetivos, que
este tipo de agricultura proporciona. Quando as famílias necessitarem do
remédio para a diabetes de algum familiar querido e acharem ali os rizomas da
batata yacon, os laços estarão estabelecidos e a relação com aquele local não
se dará apenas nos mutirões de manejo.
Ao
lado destes berços, espaçados a cada 3 metros, foram escavados mais 3, um
central serviu para a instalação das estacas, que foram plantadas
aleatoriamente, procurando diversificar as espécies. E ao lado deste berço,
entre os berços das mudas, 2 berços que servirão para receber sementes, que
originarão as plantas “criadoras”, são espécies que germinam primeiro e
permitem através do sombreamento e estímulo pelo
desenvolvimento, fazer sombra as estacas que se formarão e as mudas das árvores
que foram plantadas ao redor. Foi utilizado o adubo verde trefrósia, o feijão
de porco, o quiabo e o araribá para exercer esta função no Sistema.
A
distribuição das mudas é realizada pela Carmem, companheira do Valdir
Nascimento, esta operação de arquiteta da Natureza, é de papel relevante na instalação
dos Sistemas Agroflorestais. Ter o conhecimento da função de cada planta no
Sistema. Seu gosto pela luz e se são plantas de Diversidade, que como o nome
indica, comporão nossa floresta formando o bosque das árvores do futuro. São
exemplos destas espécies: nêspera, pitanga, ingá, pau-brasil, castanhas do
maranhão, árvore do dinheiro e tamboril. Alternando as mudas de Diversidade é
disposto as plantas de Serviço, as plantas de Preenchimento. Estas alimentarão
o Sistema, aceitando podas, quando manejadas, fornecem as folhas e os caules
para o fornecimento de umidade e nutrientes necessários para as mudas de
diversidade, entre estas espécies, o urucum
e o sabão de soldado presta-se a este fim.
Um
aspecto importante foi nos alertado: o plantio das mudas que estão no saquinho
deve ter atenção plena, o cuidado com a retirada do saquinho é minucioso, a
disposição do que é raiz, o que é colo da planta e o que é caule, a parte
lignificada.
Muda de aroeira produzida em tubete - não existe idade para começar, desde a semente até a idade da árvore adulta, estamos sempre reaprendendo a recomeçar. |
Isto é definido pela Natureza e deve ser mantido com cuidado
quando a muda é colocada no solo, deve ser medido com precisão. Se colocado
mais fundo no berço, acumula água que pode levar a morte da muda.
A muda deve ser retirada cuidadosamente da sacolinha plástica e sua profundidade não pode ir além do nível do colo, senão, morre afogada!!! |
Se plantada
muito acima do nível do solo, expõem as radicelas da raiz, o que é prejudicial
a muda. O instrutor disse ainda que é recomendável também que se disponha a
muda de forma que a enxurrada seja desviada, impedindo que se lave o solo ao
redor da muda.
O plantio de árvores nos assentamento de reforma agrária do Vale do Paraíba e nos mutirões agroflorestais é uma atividade de formação de base de crianças e jovens para a cidadania ecológica integral. |
Para arrematar o trabalho, o solo ao redor do torrão é socado
com um pauzinho para fixar bem a muda e é disposto um tronco sobre o solo ao
redor da muda de forma que a decomposição do material constituinte permitir a
formação de solo fértil, num futuro próximo, além de fazer um terraço, que
impede a formação de enxurrada e erosão.
A utilização de pedaços de madeira em reflorestamento é um princípio agroflorestal preconizado pelos agricultores e agricultoras da reforma agrária. |
O tronco é delicadamente colocado
sobre o solo, de forma que com a enxada o solo possa ser remexido na capina sem que retire o tronco do solo, permitindo a ação dos microrganismos e a
perfeita decomposição futura do material. Resta ainda uma operação final: a
cobertura da muda com a braquiária ceifada, com o cuidado de não abafar a muda.
Permitindo que a água umedeça a muda, permitindo que a muda e o torrão onde estão
dispostos “respirem”.
Distribuição de madeira no entorno das mudas para conservação do solo, liberação de lignina, que garante boa estrutura e ativação da biota que degrada a madeira. |
Restou
a semeadura das sementes nos berços laterais as estacas e ainda a semeadura e plantio
junto da estaca. Nos primeiros berços foram semeados a trefrósia, o quiabo, o
sabão de soldado e o araribá, como dito anteriormente, junto à estaca foi
plantada uma muda de palmeira, a baba de boi ou jerivá e mais três sementinhas
de quiabo.
Finalizando
o serviço do dia, a cobertura de todas as ruas, todo o solo que foi descoberto,
é coberto com a braquiária, ceifada e delicadamente sobreposta ao solo e ao
redor das mudas.
Cobertura morta de braquiária ativa a vida do solo e beneficia as árvores que irão frutificar, dar sombra, abrigo para a fauna e produzir frutos. |
É
hora de ir ao lote de dona Maria repor as energias e como prometido no chamariz
“Ao final, será oferecida refeição com produtos
locais”. Um panelão de frango caipira, uma couve finamente cortada, arroz, feijão
e uma salada de alface completaram nosso banquete. Nos fartamos com alimento
simples, saudável e da roça.
É final de tarefa,
novamente de mãos dadas fechamos a roda e o trabalho do dia agradecendo ao
Criador a possibilidade de participação de todos neste momento único de
aprendizado, o “mutirão agroflorestal”. Nosso instrutor convida os
participantes para visita para aprendizado e formação em seu “Sítio Ecológico”
no Projeto de Assentamento Nova Esperança em São José dos Campos. Descreve as
possibilidades de comercialização coletiva em curso para os produtos
agroecológicos produzidos por esta agricultura familiar que floresce no Vale. E
ainda nos convida para a “Semana de Agroecologia” a ser realizada de 1º a 6 de
outubro próximos em São José dos Campos no Parque Vicentina Aranha.
Ficou marcada para
outubro ou novembro a próxima reunião de mutirão a ser determinada.
Me despeço deste
agricultor, o Valdir Nascimento e sua companheira a Carmem, um vivericultor, que
tem prazer em formar e distribuir mudas nativas, com aprendizado no coração e sementes
e mudas para plantar em meu lar, entre elas, a Santa Bárbara, que alimentarão a
família de tucanos que vivem em meu
bairro.
Imagens: Rejane Martis, Carmem Faria Nascimento, Valdir Nascimento
Adaptado para blog: Antonio Devide
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