Relato técnico do Curso Manejo Biodinâmico de Sistema Agroflorestal avançado com foco em banana, frutas nativas e araruta
Por Julia Trommer de
C. Vaz, gestora ambiental, Pindamonhangaba, SP, Brasil, relatoria técnica, e
Antonio Carlos Pries Devide, pesquisador
da Apta Regional de Pindamonhangaba,SP, Brasil, revisor.
Figura 1. Participantes do Curso de manejo de SAF avançado com foco em bananeira, frutas nativas e araruta, Apta Regional de Pindamonhangaba, SP.
Resumo
Pesquisa participativa na Apta
Regional de Pindamonhangaba
Figura 2. Preparo prévio da área do SAF avançado em curso de longa
duração na Apta Regional de Pindamonhangaba (2019).
Figura 3. Programação do Curso de Manejo Biodinâmico de Sistema Agroflorestal avançado com foco em banana, frutas nativas e araruta.
Pesquisas em Soberania e segurança alimentar e nutricional com ênfase na araruta sob manejo biodinâmico
Da araruta,
falou do seu comportamento no sistema consorciado, suas exigências, adaptação à
meia sombra e áreas mais úmidas, mecanismos de tolerância ao estresse hídrico e
térmico por meio do movimento do pulvino e enrolamento das folhas, além da
produtividade nesse sistema de cultivo. Dessa espécie, aprofundou sobre a
importância do uso do polvilho de araruta na soberania e segurança alimentar e
nutricional, suas propriedades alimentícias e medicinais. O cultivo da araruta
faz parte da história brasileira desde o descobrimento e antes, pois era
cultivada e beneficiada pelos povos originários na Mata Atlântica. Cristina
propôs em suas pesquisas o resgate cultural com o cultivo e beneficiamento
desse alimento benéfico para a saúde, podendo substituir o polvilho de mandioca
em muitas receitas. Algumas das espécies rizomatosas cultivadas no local são:
araruta-comum - Maranta arundinacea L.,
araruta-ovo-de-pata - Myrosma cannifolia L.f.
e araruta-taquarinha (ainda não identificada) da família Marantaceae, e
ararutão - Canna edulis Ker Gawl.,
que apesar do nome popular, pertence a família Cannaceae.
Introdução ao uso dos preparados biodinâmicos
Em seguida, a Engª Agrônoma Ana Rezende apresentou aos participantes as bases da Agricultura Biodinâmica e sua definição, segundo Rudolf Steiner;, o histórico e a introdução no Brasil, até a fundação da Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica - ABD. Ressaltou a importância da ABD na manutenção e divulgação das metodologias, estudos e oferta de insumos, sementes, preparados biodinâmicos e a atuação como SPG - Sistema Participativo de Garantia da qualidade orgânica e Demeter. Ainda apresentou a agenda biodinâmica e o calendário biodinâmico, criado a partir das pesquisas da agricultora alemã Maria Thun, que há mais de 50 anos estudou a influência da lua e dos astros nas plantas. A agenda traz um calendário que contempla as atividades de plantio, cultivos, manejo e colheita conforme as fases da lua para auxiliar os agricultores a se manterem conectados com as forças universais, reforçando o conhecimento ancestral indígena, sendo um instrumento de reconexão entre o universo e a terra.
Ana Rezende explicou sobre os preparados biodinâmicos e suas aplicações: chifre esterco, chifre sílica e o fladen, estes foram aplicados anteriormente na área de SAF simples no âmbito das pesquisas da Dra. Cristina Castro, com objetivo em auxiliar a araruta e o desenvolvimento do sistema como um todo.
No segundo momento do dia, Ana Rezende conduziu o feitio do preparado biodinâmico fladen, explicando a importância da dinamização e da presença consciente no alinhamento do feitor com as intenções desejadas naquele preparado e no cultivo (Figura 5). Os participantes puderam auxiliar na dinamização e pulverização, realizada com ramos de folhas, semelhante ao ato de benzimento, aplicando o preparado em toda a extensão dos SAF após a poda da gliricídia e do araribá, conduzidas durante as atividades de manejo no Curso. A utilização deste preparado tem o princípio fundamental de auxiliar o processo de decomposição da matéria por meio da reorganização bioenergética do sistema.
Figura 5. Introdução ao uso do preparado fladen na agricultura biodinâmica nos sistemas agroflorestais da Apta Regional de Pindamonhangaba (22 e 23/02/2025).
Pesquisas em transição biodinâmica de Sistemas agroflorestais com foco na bananeira e frutas nativas
Foi explicada a construção desse SAF em etapas, iniciada a partir de um experimento de plantio direto de estacas de diferentes diâmetros de gliricídia em grama batatais. Conforme verificado pela pesquisadora Johanna Dobereiner, no ano de 1963, essa grama nativa também realiza a fixação biológica do nitrogênio de maneira parecida ao que ocorre em plantas leguminosas, como a gliricídia, razão pela qual a área não foi arada e optou-se pelo sistema de plantio direto do SAF. A Dra. Cristina descreveu a crescente demanda por estacas de gliricídias no campo das pesquisas, iniciando este banco de matrizes em 2016 (Figura 6).
O amplo espaçamento das estacas possibilitou o plantio experimental de variedades antigas e novos cultivares de bananeiras de maneira alternada com a gliricídia, na linha, para serem avaliadas dentro de um sistema agroecológico de produção com baixo uso de insumos externos.
Manejo do SAF avançado durante o
Curso
Figura 8. Exposição com explicações sobre o uso de ferramentas,
equipamentos e materiais de segurança na Apta Regional de Pindamonhangaba (22 e
23/2/2025).
Figura 9. Manejo de SAF biodiverso
em transição biodinâmica na Apta Regional de Pindamonhangaba, SP.
Figura 10. Demonstração da técnica do “copinho” na eliminação das bananeiras para controle do “moleque da bananeira”.
Resumo do manejo: Durante o curso foi manejada uma área de pesquisa
em SAF avançado com 400 m² (10 x 40 m), consistindo de poda dos seguintes
componentes: araribá e outras espécies do estrato alto, como pau ferro e
jatobá, retirando-se as ramificações laterais para formação de fuste reto; poda
da gliricídia para se manter como quebra vento e reduzir o efeito da geada sem
sombrear excessivamente as bananeiras; e condução das touceiras de banana,
fortalecendo as plantas que irão frutificar, aumentando a luminosidade e
fornecendo matéria orgânica para o sistema, cobrindo o solo por completo de
forma a não prejudicar a cúrcuma (Figura 11).
Figura 11. Imagem das atividades de manejo do Curso nas áreas de
SAF avançado.
Pesquisas de semeadura direta de muvuca de sementes com ênfase em
frutas nativas
Dr. Antonio
Devide realizou uma apresentação na área de muvuca de sementes com foco em
frutas nativas regionais, uso da bananeira na restauração e outros componentes
da sociobiodiversidade, como milho variedade, com o objetivo de apresentar esta
técnica inovadora de restauração como alternativa aos proprietários rurais e
projetos no ramo da restauração ecológica produtiva em reserva legal e APP
(Figura 12).
Figura 12. Visita técnica na área de restauração com muvuca de sementes florestais na Apta Regional de Pindamonhangaba (22 e 23/2/2025).
Essa área de
pesquisa foi semeada com a muvuca em 2023 e vem sendo enriquecida a cada manejo
anual. Antonio, Valdir e Carlos utilizaram essa área como laboratório para
explicar o comportamento de algumas espécies utilizadas como placenta e
criadoras das espécies que virão a ser as principais espécies no sistema, no
caso de frutíferas e árvores nativas, aprofundando o tema das diferentes fases
de sucessão e estratificação, que são conceitos relevantes para o entendimento
do manejo dos sistemas agroflorestais.
Caracterização dos participantes
O Curso
recebeu ao todo 30 participantes de diferentes localidades do Vale do Paraíba,
principalmente de Pindamonhangaba, Taubaté e São José dos Campos, além de dois
participantes do Sul de Minas Gerais.
O Curso reuniu público diversificado composto principalmente por pessoas ligadas à terra, entre agricultores, proprietários rurais e assentados da reforma agrária, além de técnicos de diversas áreas (Figura 15), predominando homens na faixa de 40 e 50 anos e 30 a 40 anos e mulheres entre 40 e 50 anos (Figura 16).
Figura 15. Perfil dos participantes do Curso de manejo de SAF
avançado ministrado na Apta Regional de Pindamonhangaba (22 e 23/2/2025).
Figura 16. Gênero e faixa etária dos participantes do Curso de manejo de SAF avançado ministrado na Apta Regional de Pindamonhangaba (22 e 23/2/2025).
Troca de experiências
Durante as
rodas de apresentação e de trocas de experiências foi possível conhecer melhor
o perfil dos participantes e as produções agroecológicas e orgânicas em
desenvolvimento. Alguns destes, o produtor de café agroflorestal sombreado, da
Fazenda Campo Místico em Bueno Brandão - MG descreveu seis talhões de produção
agroflorestal iniciados em 2017. Na Serra da Mantiqueira, o produtor Milton
Roberto compartilhou suas experiências na produção de banana orgânica, explicou
como realiza o manejo das bananeiras e compartilhou barrinhas de bananinhas
‘Nana Banana’ com os participantes. O engº agrônomo e professor da Universidade
de Taubaté Julio Cesar Raposo descreveu suas pesquisas com palmeiras
contribuindo para o entendimento sobre a fenologia reprodutiva e aproveitamento
do jerivá e juçara. A pesquisadora Tatiana Cabral de Vasconcelos citou os
projetos que coordenou com a Rede Agroflorestal na implantação de SAF em
assentamentos de reforma agrária no Vale do Paraíba, destacando a importância
dos mutirões e do diálogo com as instituições de pesquisa, como a Apta, para o
fortalecimento dos projetos na região. A veterinária e pesquisadora da USP
Flávia Malacco relatou sua experiência na elaboração de rações alternativas
para bovinos e da necessidade de abertura de pecuaristas para uma nova
perspectiva de produção em sistemas silvipastoril devido à constante reclamação
de queda da produtividade e ausência de pastagens de qualidade diante dos
extremos climáticos. Outros participantes auxiliaram nas explicações sobre segurança
no trabalho, uso adequado de EPI e equipamentos de escalada na coleta de
sementes (Robson Correa). A Dra. Cristina Eustáquia e seu companheiro o
arquiteto Irineu Pinto relataram os projetos de restauração de uma nascente com
muvuca de sementes com ênfase na juçara em sua propriedade rural em
Pindamonhangaba, que conta com o apoio do Corredor Ecológico do Vale do Paraíba
e tem como instrutores Valdir Martins e Carlos Silvestre. Muitas experiências
foram comentadas sobre os SAF em assentamentos de reforma agrária no Vale do
Paraíba: Nova Esperança em São José dos Campos com as famílias camponesas,
entre elas o Sítio Ecológico de Valdir Martins. Também participaram
agricultores dos assentamentos Egídio Brunetto e Macuco, de Lagoinha e
Conquista, de Tremembé.
Demandas apontadas
- Necessidade de mais pesquisas aplicadas sobre SAF;
- Novos cursos de manejo de SAF
avançado;
- Cursos para uso de equipamentos
(motosserra e motopoda);
- Fortalecer e reconhecer os
produtos agroflorestais;
- Organizar a comercialização e a
cadeia produtiva dos produtos agroflorestais;
- Mais viveiros de mudas nativas
para SAF.
Referências bibliográficas
https://revistapesquisa.fapesp.br/o-legado-de-johanna-dobereiner/
https://www.gvaa.com.br/revista/index.php/RVADS/article/view/8713
https://www.iac.sp.gov.br/media/publicacoes/iacdoc118.pdf
https://redeagroflorestalvaledoparaiba.blogspot.com/2021/12/rede-em-ciencia-e-tecnologia-para-o.html
TEXTO ADAPTADO PARA O BLOG POR: ARTHUR LUIS FERMIANO DA SILVA