5 de ago. de 2019

EXPERIÊNCIAS COM SISTEMAS AGROFLORESTAIS E RESTAURAÇÃO ECOLÓGICA NO VALE DO PARAÍBA DO SUL

RELATO DO CURSO DE LONGA DURAÇÃO EM AGROECOLOGIASítio dos Ipês, Cruzeiro - SPData: 03 - 07 - 2019


Por: Antonio Carlos Pries Devide
Engenheiro Agrônomo, Dr. Pesquisador científico. Polo Regional Vale do Paraíba, Pindamonhangaba – SP. E-mail: antoniodevide@apta.sp.gov.br

Agricultor instrutor Thales Guedes Ferreira
Biólogo, Produtor rural pesquisador de sistemas agroflorestais. Sítio dos Ipês, Cruzeiro – SP.
E-mail: thales1ferreira@gmail.com
O produtor rural Thales Ferreira (Sítio dos Ipês) explica os detalhes da poda de rebaixamento e desrama do eucalipto para o engenheiro agrônomo Miguel Quevedo (INCRA).


RESUMO

Acompanhamos e valorizamos as experiências de agricultores que praticam a restauração ecológica com sistemas agroflorestais - SAF. Esse é um dos objetivos do Curso de Longa Duração em Agroecologia (APTA+INCRA), que visa fortalecer o coletivo de técnicos e agricultores para disseminar os SAF como política pública que visa à proteção do ambiente e a geração de renda. Esse relato contempla a visita e mutirão com participantes do Curso no dia 03/07/2019 na propriedade rural Sítio dos Ipês, em Cruzeiro, onde o jovem agricultor assumiu a propriedade rural familiar e introduziu os SAF para regenerar a paisagem degradada pelo eucalipto e a pecuária, com policultivo de hortaliças e plantas anuais em consórcio em faixas entre as linhas de vegetação arbórea biodiversa. Foram visitados modelos experimentais de restauração florestal a partir de mudas e muvuca de sementes arbóreas. Para a degustação foi preparada saborosa refeição com ingredientes locais e a puba de mandioca. O agricultor coopera na disseminação das tecnologias vinculado ao projeto Despertar do Gigante e Rede Agroflorestal do Vale do Paraíba, sendo um importante agente de formação técnica na região do Vale do Paraíba.
Palvras chave: Agricultura Familiar. Restauração ecológica. Mutirão agroflorestal.

INTRODUÇÃO
        O objetivo desse trabalho é relatar a experiência de um agricultor experimentador de sistemas agroflorestais - SAF de base agroecológica, em uma propriedade rural familiar de 97.000 m² situada em relevo montanhoso às margens da rodovia Presidente Dutra, no município de Cruzeiro.
         O uso do solo tem início no ciclo do café em plantio morro abaixo com forte erosão, substituído por Eucaliptos e capim gordura pastagens extensivas para a pecuária leiteira. 
        A introdução de sistemas agroflorestais para produção de hortaliças irrigada com baixa pressão teve início no ano de 2014 e em 2018 realizou-se a implantação de talhões de restauração florestal com diversos tratamentos.

SISTEMAS AGROFLORESTAIS
A diferença entre os SAF é principalmente em relação a posição do plantio: declive e nível. A conservação do solo é feita com cobertura morta de folhas de árvores, capim napier picado, capim mombaça, e resíduos de poda. Principalmente, nas faixas de cultivo dispostas no sentido do declive, para maior captação luminosa na faixa interna com hortícolas. 
Os canteiros são preparados no primeiro ano, com carreadores recebendo a madeira roliça cortada de árvores do entorno, como o eucalipto (Eucalyptus urophylla), podado com serrote a 6,0 m de altura. No terceiro ano o corte dessa espécie é realizado na base. Com a supressão do eucalipto, o mogno africano (gênero Khaya) plantado em alta densidade passa a ocupar o estrato alto, sendo raleado em seguida.
O plantio simultâneo de diversidade de hortaliças e culturas anuais segue o arranjo espacial nos canteiros e nas linhas externas, enriquecidas com e frutíferas nativas alternadas com árvores nativas e exóticas.

SAF novo em plantio morro abaixo com linhas de banana intercaladas com árvores frutíferas e madeiras nativas e exóticas de ciclo curto (poda) e longo, adubação verde de feijão de porco.

SAF em pousio com capim marandu para cobertura do solo nas entrelinhas.
Detalhe da cama de palha fornecida pela roçada do capim marandu: a fitomassa do capim é acumulada na faixa de cultivo, onde há terra úmida e fértil, com agregados da atividade da fauna do solo.
Logo abaixo uma faixa com mandioca crescendo em canteiros cobertos por folhas secas e rama herbácea de eucalipto. Vale ressaltar que a mandioca é uma das culturas tropicais de maior potencial de erodibilidade do solo, devido o crescimento lento. Nesse caso, o solo está completamente protegido da erosão.
Cobertura do solo com culturas de inverno. Detalhe da poda do eucalipto e a bananeira crescendo entre as árvores.
Detalhe das novas faixas com SAF em pousio com culturas de cobertura de inverno (chícharo, aveia branca, tremoço) nas faixas de cultivo intercalar. A madeira da poda do eucalipto é utilizada em carreadores.
Vista inferior de outro SAF com plantio recente de hortaliças em consórcio: entre os canteiros há toretes de madeira cobertos com serragem e por onde desce as mangueiras de irrigação
Vista superior do mesmo SAF com plantio recente de hortaliças em consórcio - repare que o sistema está plantado morro abaixo, com solo totalmente coberto por palha. Ao fundo, no lado oposto da Rodovia Presidente Dutra, em outra propriedade rural, o eucalipto é visto também plantado morro abaixo, porém, sem os mínimos cuidados para conter a erosão laminar do solo.
Mutirão: preparo de canteiro para o plantio de hortaliças após a aplicação de termofosfato, areia, silicato de potássio e calcário, sendo os mesmos incorporados com enxada  rotativa.
Mutirão: no preparo de canteiro para o plantio de hortaliças foi aplicado esterco de curral curtido, madeira de poda de eucalipto em contorno e folhas de varrição da vegetação arbórea.
Thales Ferreira explica que após o mutirão de preparo de canteiro para o plantio de hortaliças, com aplicação de grossa camada de grama seca e molhação, vai esperar alguns dias para o plantio de hortaliças em consórcio.
Visita ao SAF que contorna a área ciliar da nascente, destacando o estágio inicial, com bananeiras, guandu e muitas árvores nativas em formação.
Água da nascente protegida. Há peixinhos que provavelmente foram trazidos por pássaros, porque ali antigamente não havia nada, relata Thales Ferreira. A área de preservação foi recuperada com SAF em sistema de mutirão.

RESTAURAÇÃO FLORESTAL
A restauração florestal experimental realizada no Sítio dos Ipês conta com auxílio de  diversos parceiros externos (ISA - Instituto Socioambiental, Corredor Ecológico Vale do Paraíba, Instituto Coruputuba e outros), interessados em avaliar modelos de restauração florestal para a região. Apesar de não concordar com o controle químico da vegetação espontânea, Thales Ferreira o adotou como contrapartida ao recebimento de mudas arbóreas e do coquetel de sementes vindos do alto Xingu, na região amazônica.
Na avaliação do agricultor, apesar do plantio de mudas resultar em árvores de porte mais alto nos primeiros anos, na muvuca de sementes observa a maior diversidade de espécies crescendo juntas; tal como ocorre na sucessão ecológica da mata nativa. 
Em parte da área de muvuca o agricultor plantou feijão de porco (Canavalia ensiformis), cuja colheita lhe rendeu 80 kg de sementes comercializadas a R$10,00 o quilo, gerando renda, melhorando a conservação do solo e os aspectos nutricionais para as espécies arbóreas via fixação biológica do nitrogênio (FBN).


Áreas de restauração florestal: semeadura com muvuca de sementes florestais após aração com aiveca e tração animal.

Detalhe do consórcio de espécies que se desenvolve naturalmente em meio a vegetação nativa, sendo muitas destas espécies melíferas.



ALIMENTAÇÃO 
           
          O processamento dos alimentos orgânicos e o preparo de pratos servidos no Curso foi coordenada por Daniella Rebello, chef da Barbotina Alimentos. O destaque de seu trabalho é a mandioca puba:
"...a puba é uma mandioca muito tradicional nas regiões norte e nordeste. No processo de fermentação, a mandioca adquire um sabor parecido com do queijo. Além disso, a digestão fica mais fácil e ela tem um ganho nutricional muito bacana com vitamina C, vitamina B e sais mineras..." - Daniella Rabello de Azevedo.
             A mandioca puba também é encontrada no litoral da região Sudeste, berço da cultura da mandioca como base da alimentação tradicional de eras pré-colombianas. Por ser muito apreciada pelos caiçaras, no litoral Norte de são Paulo, no Sertão do Ubatumirim, em Ubatuba, ainda é possível encontrar a produção de mandioca puba nativa. 
Massa de mandioca puba com azeite, tomate, orégano e gergelim, servidos na folha da bananeira.

Daniella Rabello apresenta a massa de mandioca puba que produz e que utilizou no preparo de alimentação riquíssima.
Alimentação riquíssima: brotos de ervilha com mandioca puba, fava, virado de amendoim com castanhas, arroz integral, salada...
TRATAMENTO DOS EFLUENTES
                  Foi apresentado o sistema em bateria para tratamento dos efluentes. Modelo: Embrapa.

2 comentários:

  1. Parabéns a todos os envolvidos. Vivas à SAF e à força do coletivo, pela união e estreitamento dos laços, pelo bem COMUNitário!

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